PARASHÁ 08 - VAYISHLACH

 



PARASHÁ COMENTADA


Parashá 08 - Vayishlach - Gênesis 32:3 à 36:43


Haftará: Obadias 1 à 21; Mateus 5:23-24; 1 Coríntios 5:1-13; Apocalipse 7:1-12


Belém, 06 de Dezembro de 2025 - 16 de Kislev de 5786


Comentário Judaico Netsari sobre o Estudo semanal da Torah do Ciclo anual das Parash'ôt.


Contexto Histórico:


Ya'akov envia mensageiros a Esaú mas recebe uma resposta não muito animadora, seu irmão já estava vindo com quatrocentos homens armados, Ya'akov então acampa-se as margens do rio Jaboque, fez passar o vau do rio Jaboque toda a sua família e só ele ficou para orar ao Eterno. 

Vau de Jaboque significa um local raso do Rio Jaboque, onde era possível atravessar sem maiores dificuldades, Jaboque é um afluente do Rio Jordão com aproximadamente 100 quilômetros de extensão. O vau de Jaboque ficou conhecido na Bíblia principalmente por ter sido o local onde Ya'akov lutou e foi abençoado por D'us.


Na atualidade o Rio Jaboque é chamado de Nahr Ez-Zarpa, que significa “rio azul”, esse significado indica a tonalidade azulada de suas águas, o rio Jaboque flui através de desfiladeiros profundos e acidentados, por isto também é comum a expressão “vale de Jaboque”.


Por causa da geografia da área em que se localiza o Rio Jaboque, sua correnteza em alguns pontos é consideravelmente forte, principalmente na estação das chuvas. Para se ter uma ideia, as águas do Jaboque descem de mais de 500 metros de altitude até cerca de 30 metros abaixo do nível do mar.

A região por onde se estende parte do Rio Jaboque formava um tipo de fronteira natural no território dos amorreus dividido pelos reinos de Seom, de Hesbom, e Ogue, de Bashã, naquela área também ficava a fronteira oeste dos amonitas (ver Deuteronômio 3:16).


Do tempo dos patriarcas, Esaú e Ya'akov tiveram livre acesso para passar pelo Jaboque, porém mais tarde, sob a liderança de Moisés, o povo de Yisrael conquistou aquelas terras, e o Jaboque constituiu um dos limites do território desapossado pelos israelitas (ver Números 21:24; Deuteronômio 2:37; 3:16; Josué 12:2; Juízes 11:13,22).


A Luta de Ya'akov com sigo mesmo:


Enquanto Ya'akov está se preparando para seu confronto épico com seu irmão separado Esaú, ele tem um confronto bizarro com alguém totalmente inesperado:


"E Ya'akov ficou sozinho, um homem (ish - אִישׁ) se pôs a lutar com ele até o amanhecer, quando  viu que não poderia dominá-lo, tocou na articulação da coxa de Ya'akov, de forma que lhe deslocou a coxa, enquanto lutavam. Então disse: Deixe-me ir, pois o dia já desponta. Mas Ya'akov lhe respondeu: Não te deixarei ir, a não ser que me abençoes. ele lhe perguntou: Qual é o seu nome?  Ya'akov, respondeu ele. Então ele disse: Seu nome não será mais Ya'akov, mas sim Yisrael, porque você lutou com um anjo de Elohim e com homens e venceu. Prosseguiu Ya'akov: Peço-te que digas o teu Nome. Mas ele respondeu: Por que perguntas o meu Nome?  E o abençoou ali." - Gênesis 32:24-29


Vamos aos fatos: O texto da Torah declara que Ya'akov estava sozinho então, quem lutou com ele se não havia mais ninguém nesse lugar?

No texto: "quando  viu que não poderia dominá-lo, tocou na articulação da coxa de Ya'akov" Quem tocou em Ya'akov? Qual é a identidade do adversário ou adversários de Ya'akov?

Se Ya'akov está realmente sozinho, quem poderia estar lutando com ele? Uma resposta plausível seria: Ninguém! Ya'akov está realmente lutando consigo mesmo. Isso explicaria a ambiguidade no texto. No entanto fica uma pergunta lógica: por que um homem sadio lutava consigo mesmo? Voltemos ao texto hebraico, a palavra “homem” é referido no texto hebraico como um ish - אִישׁ. E encontramos outro versículo no texto hebraico no qual fica evidente que o ish - אִישׁ refere-se a Ya'akov:


"O homem (ish - אִישׁ) prosperou muitíssimo e possuía gados, servos, camelos e jumentos." - Gênesis 30:43


As Bênçãos que Ya'akov tinha tomado de Esaú se concretizaram em sua vida, ele foi para Harã apenas com um cajado na mão e retorna um homem extremamente rico, e agora ele teria que lutar contra si mesmo para não se tornar como Esaú, Ya'akov era irmão "gêmeo" de Esaú, se fosse apenas um simples irmão já era ruim o suficiente, mas um irmão gêmeo era realmente perigoso, porque isso significava que Ya'akov compartilhava com Esaú certas características genéticas inadequadas sob o ponto de vista moral e ético, como qualquer irmão gêmeo poderia compartilhar. 


Essa semelhança ficou concretizada quando Ya'akov, em uma atitude não muito ética comprou a primogenitura de Esaú, e depois levou suas bênçãos. O que Ya'akov não percebeu na época, era que ele estava assumindo mais do que o direito de primogênito, e consequentemente sua bênção espiritual especial. Na verdade, Ya’akov também estava assumindo o mau-caratismo de Esaú.


Mas ainda temos que responder outra pergunta:  Quem tocou em Ya'akov? Se Ya'akov estava lutando consigo mesmo numa luta espiritual para não assumir a identidade maligna de Esaú, quem o feriu na coxa? Lembramos que, antes desses acontecimentos, Ya'akov havia feito uma Oração ao Eterno pedindo proteção para sua vida e de sua família(ver Gênesis 32:9-12).


Adonai atendeu sua oração conforme declara o Salmo 34:7, um anjo estava lá protegendo Ya'akov mas seu temor por Esaú lhe havia cegado os olhos, Ya'akov percebe sua presença quando este toca-lhe em sua articulação da coxa, Ya'akov agora não poderia mais correr de seu irmão e nem de si mesmo, todas as vezes em que os problemas surgissem ele teria que enfrentar seu Eu interior e não fugir dele.


O Encontro dom Esaú:


"Quando Ya'akov olhou e viu que Esaú estava se aproximando, com quatrocentos homens, dividiu as crianças entre Leah, Raquel e as duas servas. Colocou as servas e os seus filhos à frente, Leah e seus filhos depois, e Raquel com Yosef por último. Ele mesmo passou à frente e, ao aproximar-se do seu irmão, curvou-se até o chão sete vezes." -  Gênesis 33:1-3


A preparação de Ya'akov para o encontro com Esaú, conforme narrado na Parashá, é um momento de grande tensão e expectativa. Após anos de separação, devido ao engano que resultou na obtenção da bênção, Ya'akov se vê diante da necessidade de confrontar seu passado. Ao saber que Esaú está se aproximando com quatrocentos homens, Ya'akov fica apavorado, temendo pela sua vida e pela de sua família.


Em resposta ao medo, Ya'akov toma medidas cautelosas, ele divide sua família e seus bens em dois grupos, na esperança de que, se Esaú atacar um grupo, o outro possa escapar. Essa estratégia reflete a prudência de Jacó, mas também revela sua nova natureza, ao se adiantar para enfrentar Esaú sozinho demonstra que estava preparado, se possível, até a morrer para salvar sua família, Ya'akov havia vencido seu Eu interior.


A reunião emocionante entre Ya'akov e Esaú, conforme narrado na Parashá Vayishlach, é um clímax emocional que representa a reconciliação entre dois irmãos que enfrentaram anos de separação e rivalidade. Após su fuga, Ya'akov se aproxima de Esaú com um misto de temor e esperança, ciente das consequências de suas ações passadas que levaram ao rompimento da relação entre eles.


Durante a reconciliação, Ya'akov também oferece presentes a Esaú como uma forma de expressar seu arrependimento e gratidão. Ele se humilha diante de Esaú, reconhecendo sua posição original como primogênito e mostrando que está disposto a fazer reparações. A resposta de Esaú, que recusa os presentes, enfatiza que a reconciliação e o amor entre irmãos são mais valiosos do que bens materiais. 

O Zohar, consciente dessa conexão de reconciliação e perdão, escreve que o confronto entre Ya'akov e Esaú foi resolvido na hora do Neila, quando a oração final de Yom Kipur é dita: "Estamos Limpos, Purificados, Perdoados e Redimidos..."


A Imprudência de Dinah:


A Parashá continua sua narrativa com a história da violação de Dinah, filha de Ya'akov e Leah. Dinah vai visitar as filhas da terra, mas é sequestrada e violentada por Siquém, filho de Hemor, o heveu. Siquém se apaixona por Dinah e pede a seu pai, Hemor, que negocie o casamento com Ya'akov.


Ya'akov, ao saber do que aconteceu, permanece em silêncio, mas seus filhos, ao ouvirem a proposta, ficam enfurecidos. Eles respondem a Hemor e Siquém com um plano de engano, dizendo que aceitarão o casamento se Siquém e todos os homens do lugar forem circuncidado.

Este plano macabro arquitetado por Shimon e Levi repercutiu tanto que fez com que Ya'akov em seu leito de morte amaldiçoasse a atitude de seus dois filhos.


A Verdadeira Teshuvá de Ya'akov:


Adonai ordena a Ya'akov que volte a Beyt'El e construa ali um altar, lembrando-o da importância de retornar aos lugares sagrados. Antes de retornar a Beyt'El Ya'akov instrui sua família e toda sua Casa a se livrarem dos deuses estrangeiros e a se purificar antes de partir para o HaMakom, o local que é considerado como a Porta do Céu, o local mais sagrado de todo Yisrael, mostrando a necessidade de santidade e dedicação quando nos aproximamos do Santíssimo Elohim Eterno.


Isto é um sinal para nós de que a nossa Teshuvá deve ser diária e não apenas uma vez. Antes de chegarem a Beyt'El Raquel morre ao dar à luz Benyamim, e sua sepultura é mencionada como um momento significativo na narrativa da família de Ya'akov. Será que Adonai impediu Raquel de pisar em solo sagrado? Sua Teshuvá teria sido realmente sincera?


Tempos depois, quando Ruben já era um homem formado e a família de Ya'akov estava vivendo em Migdal-Éder, ele cometeu um erro muito grave e ficou marcado de forma negativa por isso. A Torah diz que Ruben se envolveu num relacionamento torpe e ilícito com Bila, a concubina de Jacó. O texto bíblico não traz detalhes sobre esse episódio, mas deixa claro que Ruben dormiu com Bila. Os estudiosos argumentam que talvez a atitude de Ruben tenha sido motivada muito mais por propósitos estratégicos e políticos dentro do clã de Yisrael, do que simplesmente por desejo.

Aparentemente Ya'akov ouviu em silêncio, mas ele não se esqueceu do pecado de Ruben, e isso teve grandes implicações em sua bênção final.


Conclusão:


Ya'akov não teve a consolação de encontrar Rebeca, sua mãe, ainda com vida, e seu pai Yitzchak viveu muito pouco depois do seu regresso. E assim faleceu Yitzchak ben Avraham, Esaú e Ya'akov enterraram-no junto de Rebeca sua esposa, em Hebrom na caverna de Machpelah, no túmulo destinado a toda a sua descendên­cia. 


Esse homem foi tão ilustre em virtudes que mereceu que Adonai o cumulasse de bênçãos e não tomasse menos cuidado dele do que de Avraham, seu pai. Viveu cento e oitenta e cinco anos, que então era uma longa idade. Só teve e mereceu louvores durante todo o curso de sua vida.


Assim como Ya’akov, nós também passamos por momentos de profunda angústia, e os obstáculos adicionais que surgem, servem para nos fortalecer e então, prosseguirmos com redobrada energia. A vida de um verdadeiro israelita não é nada fácil neste mundo, porém temos uma certeza vinda do Eterno: "Eis que Eu estarei contigo e te guardarei por onde quer que fores..." - Gênesis 28:15

Que Adonai Eterno abençoe a Leitura, o Estudo e a Prática de Sua Palavra. Amén!


Congregação Israelita Netsari Beyt B'ney Avraham - Belém/Pa


Prof. Historiador: Marlon T. Troccolli


Referências bibliográficas:


TORAH - A Lei de Moisés - edição revista e ampliada - 2001 (Editora Sefer).


CHUMASH - Torá - Rabbi Meir Matzliah Melamed ZT”L (Editora Sefer).


CHUMASH - Torá - Rabbi Aryeh Kaplan (Editora Maayanot).


ZOHAR VaYikra, Parashat Emor -  p.100b


PISTONESI, José A. Geografia Bíblica de Palestina, p. 79.